segunda-feira, 27 de abril de 2009

Capítulo 06


Enquanto caminhava para a sala de aula de esgrima, Mira olhava na sua mão o pequeno pedaço de pergaminho que seu professor a passara discretamente durante a aula de História Antiga. Ela não podia deixar de aproveitar a chance de ter aula com um dos melhores esgrimistas ainda vivo, mas tinha receios, principalmente em relação ao pagamento que ele tinha pedido.

“Empregada, vou ser empregada para aprender esgrima... Ele não quer que os criados da escola arrumem suas coisas, mas uma aluna sim. Homens...”

Deu os ombros, era um bom preço a pagar se ele realmente a ensinasse como faz com seus alunos. Ela já ouvira alguns rapazes comentando sobre a rigidez e a cobrança do professor e ao mesmo tempo elogiando o quão bom Matthew de Aldearan é. Com aulas particulares com ele, Mira tinha certeza que aprenderia muito e rapidamente. Iria adorar fazer com que ele admitisse que uma mulher poderia ser tão boa em esgrima quanto um homem.

Mira bateu na porta devagar e, após ouvir a voz de seu professor, entrou. Aldearan marcara aula às seis da manhã, evitando assim que pessoas inconvinientes aparecessem e os vissem. Ele sabia que sábado tão cedo ninguém além dele e, agora, de sua nova aluna de esgrima estaria de pé.

Matthew estava com dor de cabeça. Passara a noite toda bebendo parte do estoque de sua adega particular, nervoso e ansioso com o fato de que na manhã seguinte encontraria ela em seus aposentos. Não deveria ter feito isso, é claro, mas logo sua ressaca passaria, já tomara a poção que ele mesmo preparava e engarrafava para essas ocasiões.

Sorriu ao vê-la entrar, cautelosa como uma gata em território alheio – seu território. O aposento estava uma mescla entre bagunça mal disfarçada e vários objetos que ele não tivera tempo de arrumar.

- Espero que tenhas te preparado adequadamente para a aula, Lady Barlow. – Ele disse-lhe à guisa de bom dia.

- Sim, senhor. – Ela respondeu, abaixando levemente a cabeça. – Tomei a liberdade de trazer minha própria espada.

Ele não respondeu e tomou a bainha das mãos dela, tirando delicadamente à espada. Estava zonzo, mas podia perceber que aquilo era um bom trabalho, embora as armas que ele tinha a disposição fossem, de longe, superiores. Sabia, entretanto, que se a jovem tivera coragem de trazer sua própria espada para a aula, ela deveria ter um significado especial e isso era algo que nenhuma outra poderia superar.

- Treinaremos na sala superior a este aposento milady e, de hoje em diante, tu sobes por esta escadaria em meu gabinete. – Matthew disse apontando para uma frágil escada de corda para ela. – Todo cuidado é pouco para manejar essa corda, mas como ensinou-me meu mestre: não basta saber destruir ao seu redor para um boa luta, mas respeitar e conservar o que é útil e bom é uma graça que não pode-se abrir mão.

Mira assentiu enquanto focava os olhos no professor que ainda parecia meio atordoado, embora não a ponto de não subir a corda com apenas dois passos largos e graciosos. Ele carregava a espada com a bainha verde água nas costas. Ela tentou seguir-lhe os passos, dando dois largos saltos e teve que ser segura pelas mãos calejadas de seu mestre.

- O segredo, milady, não é imitar o mapa do sucesso de outrem, e sim, criar seu próprio, adaptado aos seus conhecimentos e suas limitações. – Ele aconselhou-a enquanto puxava-a para cima.

O aposento era razoavelmente grande. Havia nele várias almofadas cinzas espalhadas, estantes com livros, uma divisória com uma mesa e duas cadeiras – que despertaram em Mira a sensação de que suas aulas envolveriam muito mais do que simples combate. Vários modelos de espadas estavam dependurados nas quatro paredes, muito bem seguras por feitiços de proteção. Eram o amor de seu professor e provavelmente, suas mais fiéis companheiras.

A moça olhou ao seu redor com um misto de respeito e orgulho. Queria fazer parte daquela sala, parte da história de aprendizes do mestre: como ela via em um canto o orgulho que o professor tinha em exibir seus ex-alunos campeões.

Matthew pigarreou e chamou a atenção dela para si, despertando-a do devaneio de quem poderia ter sido aquela primeira mulher a ser aprendiz do orgulhoso mestre.

- Não espero ter que explicar-te como deves se comportar em minhas lições. Não quero que te distraias, prestes atenção em cada palavra, em cada movimento.

E sem mais nem menos, cortou um pedaço de madeira ao longe.

- Vês?

Ela boquiabriu-se.

- Como fez isso, senhor?

- Apenas com técnicas que aprenderas se superares minha expectativa. – ele respondeu.

Não respondeu que se tratava de uma personificação de sua espada, não disse que era a combinação ideal e ilegal que se fazia entre espada e varinha. Quem disse que ele se importava com regras, de qualquer forma?

Mira olhou seriamente para Matthew e depois abaixou o rosto, humildemente.

- Que eu preciso fazer para aprender finalmente? – ela perguntou para ele, com um pouco de raiva de si por estar fazendo aquilo, mas sabia que valeria a pena segurar sua língua e seu pensamento.

Os olhos de Matthew brilharam com as milhares de possibilidades de resposta que ele poderia dar.

- Treinar, minha aprendiz. Treinar e treinar e dedicar-se de alma para com a espada. Que ela seja a extensão de seu braço, a reflexão de sua essência, à serviço de Deus. – Ele respondeu e, contendo-se para não adicionar outros tantos elementos, deu por encerrada a parte teórica da aula, passando a próxima uma hora com os exercícios básicos e aperfeiçoando a técnica mais simples de sua aluna.

Sorriu, satisfeito consigo mesmo.

2 comentários:

Ingrid Reis disse...

Eu estou amando a história, Lady Barlow é o meu tipo de personagem preferido, sempre aquele que foge as regras da sociedade, eu absolutamente amo isso. Continuem escrevendo, estou anciosa para o próximo capítulo...
Beijinhoossss

Pensieve disse...

Que ansiedade pra ver logo a aula da Mira! Ainda bem que o próximo capítulo já sai amanhã xD

Beijos! Liv